domingo, 8 de abril de 2012

Carmim 17



Reconheceu a boca marcada na bituca de cigarro. Era o Carmim 17 que ela tanto adorava. Era capaz de imaginá-la tocando os lábios no papel branco como quem toca os lábios de um amante ardente. “Ela esteve aqui com toda certeza”.

Ainda sentia o seu cheiro, uma mistura de hidratante, perfume floral e nicotina. “Ela esteve aqui e saiu há pouco”. 

A cada passo, se aproximava do interior da casa e percebia o calor do corpo roliço daquela louca. “Ela esteve aqui e talvez ainda esteja”.

Ao entrar no quarto ainda escuro, ouviu sua respiração e percebeu sua pulsação acelerada quando, ao tocar o interruptor, foi agarrado por sua mão forte e cheia de anéis. A luz apenas piscou, mas conseguiu ver seus olhos de fúria e sua face vermelha. “Ela ainda está aqui”.

Um calor líquido inundou sua barriga e escorreu pelas suas pernas. Era a outra mão dela que lhe enfiava com força uma pequena faca de cortar frutas.

Lembrou-se de ter cortado uma maçã ao meio antes de sair de casa. 

Sentiu o cheiro da fruta se misturar ao sangue.

Sentiu o gosto da maça e do carmim 17 pela última vez.

Nenhum comentário:

Postar um comentário