quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Equilibrista


Ela se equilibra no salto agulha, enquanto carrega no colo seu filho de quatro anos, que dorme um sono profundo. Nas costas, uma mochila com desenhos de super-heróis guarda uma troca de roupas, um brinquedo, e as fraldas que o menino deficiente ainda usa.

Sua saia justa e brilhante é ajeitada a cada três ou quatro passos. A blusa preta transparente não esconde o peito magro onde o menino descansa e baba. A maquiagem carregada esconde a Maria Aparecida que, depois das 22:00, atende por Mary.

O relógio marca 21:15 quando com dificuldades ela bate à porta do barraco de um cômodo, mal iluminado por uma lâmpada amarela que pende do teto. As mãos enrugadas de uma senhora com cara amarrada conta as notas de 10 enquanto a mãe amorosa acomoda o filho no beliche onde outras duas crianças se espremem.

Beija o menino na testa, faz algumas recomendações a velha babá que finge prestar atenção, pega sua pequena bolsa de lantejoulas pretas dentro da mochila do garoto e sai apressada. Joga a bolsinha no ombro e desce a ladeira de terra batida num galope de alto risco. Ela sabe bem que se chegar atrasada, volta pra casa sem um tostão e ainda com um olho roxo e algum osso quebrado. O dono do ponto não suporta perder dinheiro e vive ameaçando ceder sua vaga ao Paulo, vulgo Mulata Bunda Grande.


É... essa é Maria. Mulher de verdade que sabe que a concorrência com os travestis é cada vez mais difícil e desleal. Fazem o mesmo serviço, com a vantagem de poder trocar de papel e pelo mesmo preço.